quarta-feira, 18 de novembro de 2020

XII encontro dos BRICS – O que ele traz na prática? O que são os BRICS hoje na política mundial?


A
cabou de acontecer o XII encontro dos BRICS. Você sabe o que ele representa para quem atua na área internacional?
 
O BRICS é um bloco econômico e político que nasceu da inspiração de um economista do Goldman Sachs. Inicialmente incluía Brasil, Russia, Índia e China. A "South Africa" veio depois e completou o acrônimo. 

Eu embarquei cedo no comboio dos BRICS (por exemplo, com este artigo). E fui muito surpreendido. Cheguei a pensar que era uma moda passageira. Mas o bloco criou uma infraestrutura institucional inegável e hoje é um grande objeto de estudo e de trabalho.
 
Sobre a reunião atual, cabe destacar alguns pontos da estratégia econômica e do cenário político.
 
A)   SOB O ASPECTO ECONÔMICO E PROFISSIONAL

A estratégia econômica conjunta do bloco BRICS foi intitulada Strategy for BRICS Economic Partnership 2025, indicando um plano quinquenal de ação. Destaquei os pontos principais.
 
1.   BRICS devem buscar atuação conjunta na OMC para avançar a posição de nações que ainda precisam de tratamento favorecido.
 
O que isso quer dizer:  Fique atento para a possibilidade de atuação profissional junto à OMC, seja como representante de uma associação, como advogado ou como consultor contratado pelo governo. A advocacia junto à OMC é uma área que existe e uma das advogadas do meu escritório atua nela! Não fiquem intimidados. A OMC, apesar da aura de poder, é uma organização internacional e as organizações internacionais no fundo são repartições públicas.
 
 2.    Apoio institucional a associações e câmaras de comércio
 
O terceiro setor, quando apoiado por entidades internacionais, gera organizações que rivalizam com a iniciativa privada. E um dos projetos do BRICS é fomentar associações, câmaras, conselhos empresariais, grupos de estudo e outros órgãos que possam gerar negócios e cooperação entre os países do grupo.

Isso às vezes se reflete em financiamento direto, outras vezes em apoio institucional, ou apenas em boa vontade política. Mas com certeza funciona.
 
Quem tiver interesse na área pode procurar as diversas câmaras de comércio de países BRICS, ou até as câmaras especiais que levam o nome BRICS e representam vários países de uma vez só. Existe até uma câmara que junta BRICS com Asean.

Há também organizações de pesquisa especializadas no assunto, com destaque para o BRICS Policy Center, que funciona no Brasil, junto ao Instituto de Relações Internacionais (IRI) da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).

3.         Setor financeiro e bancário
 
O banco dos BRICS tem atuado bastante e é um dos órgãos (por assim dizer) mais eficazes do bloco.  
Fora o banco, há uma tentativa grande de viabilizar o comércio intrabloco utilizando moedas próprias (e uma das metas BRICS 2025). A base legal para isso já vem sendo consolidada, mas o mercado ainda não embarcou em peso.

Porém, noto que há um caminho inovador sendo explorado pelas empresas: o uso de  instrumentos de garantia financeira, que, por sua natureza, não dependem do uso direto do dólar.

O maior exemplo foi a mudança legislativa no Brasil que permitiu que fazendas fossem dadas em garantia para empréstimos estrangeiros. Na prática, isso permite que investimentos chineses em agricultura sejam financiados por bancos chineses ou pelo banco dos BRICS.

Outra forma de se fazer isso é por meio de emissão de cartas de crédito (L/C)  ou cartas standby (SBLC) com denominação direta em moeda chinesa ou russa.

Essa área é bastante carente de profissionais. 
 
4. Métodos preferenciais de aplicação
 
Os métodos escolhidos para realizar a agenda dão destaque para a troca e acumulação de dados. Isso abre um campo largo de atuação para profissionais que queiram levantar, tabular e interpretar essas informações.

 
B)   SOB O ASPECTO POLÍTICO
 
Acho que todo mundo notou que a reunião deste ano teve um tom meio que constrangido.

Entendo que isso ocorre porque os interesses geopolíticos dos membros não estão bem alinhados.

Por exemplo:

a)    Índia e China tiveram embates militares este ano;
b)    O governo brasileiro, ainda que sutilmente, ainda aposta no Trump como presidente dos EUA. Mas isso vai contra os interesses da China;
c)    Os governos brasileiro e chinês têm divergido quanto à aprovação da vacina chinesa contra a COVID-19;
d)    Há divergências entre Rússia e China, de um lado, e Brasil, do outro. Essas divergências estão relacionadas a interesses políticos atuais, mas também a questões ideológicas profundas, tais como a opção pelo comunismo, pela Quarta Teoria Política, a orientação ocidente x oriente, etc.
 
Num cenário como esse, é natural que a roupa suja fique guardada e que a reunião ganhe um aspecto etéreo, cheio de generalidades.

A realidade, por outro lado, guarda divergências profundas.

 

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