quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Exportei e o importador deu calote. O que fazer?


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Hoje mesmo recebi uma mensagem me perguntando sobre isso.  O que fazer quando se vende para um cliente no exterior e o cliente não paga?

Receber o pagamento pelas exportações é muito importante, não só pelo motivo econômico óbvio, mas também porque a falta de recebimento pode acarretar inspeções pela Receita Federal e até a aplicação de penalidades, caso a Receita entenda que o não pagamento constituiu na verdade algum tipo de fraude, para evitar o pagamento de tributos ou para transferir patrimônio ao exterior.


VERSÃO 1: EXPORTAÇÃO BEM PLANEJADA E BEM DOCUMENTADA

Quando o contrato de exportação é redigido com antecedência (antes do embarque), este tipo de problema é previamente imaginado e as soluções para ele já constam do contrato.

O contrato pode prever que o foro de eleição (a "justiça" que vai cuidar da cobrança) fica próximo da sede do comprador. Talvez na mesma cidade ou mesmo estado. Ex: Xangai, Moscou, Houston.

Neste caso, o exportador já pode contratar um advogado e iniciar a cobrança judicial da dívida.

Outra opção é a previsão de arbitragem, que pode ser feita no Brasil ou no exterior. Caso a arbitragem tenha como sede o Brasil, o exportador já pode acionar a câmara arbitral e iniciar um julgamento. As decisões arbitrais, mesmo as publicadas no Brasil, podem ser facilmente executadas na maioria dos países.

Melhor ainda seria se o contrato tivesse previsto pagamento por carta de crédito, o que impediria o calote, pra começo de conversa.

Em último caso, quando as medidas judiciais ou arbitrais não forem convenientes (ou devido ao custo, ou porque o exportador quer manter um bom relacionamento com o cliente), pelo menos o exportador terá um bom contrato, que permitirá localizar com segurança a empresa e seus diretores.

 Isso porque os documentos societários da empresa terão sido previamente analisados e o advogado terá feito uma consulta ao "Serasa Internacional", a fim de averiguar o crédito da empresa compradora.

 Assim, ficará fácil pelo menos ameaçar uma cobrança, ou fazer uma visita desaforada ao caloteiro, para gentilmente assustá-lo.


VERSÃO 2: NEGOCIAÇÃO POR EMAIL, PROFORMA INVOICE E NADA DE CONTRATO

Eu já estou nesse negócio há tempo suficiente para saber que os exportadores brasileiros são o povo mais crédulo e otimista do mundo. Quase nunca fazem contrato, muitas vezes vendem sem pedir nenhum pagamento antecipado e praticamente não fazem análise de crédito dos compradores.

Nesse caso, a incerteza é enorme.

Em teoria, o exportador poderia ajuizar ação de cobrança tanto no Brasil quanto no país onde está o importador. 

Contudo, até o ajuizamento da ação fica difícil, porque antes é preciso garimpar a documentação para comprovar que:

a) houve um contrato;
b) o contrato foi cumprido;
c) o comprador é uma pessoa identificável.

Muitas vezes, a invoice é emitida mencionando somente o nome fantasia do importador (ao invés do nome legal e do número de registro), o que dificulta a comprovação de que a empresa estrangeira tenha realmente feito a compra. Essa situação se complica ainda mais quando as assinaturas dos emails e de eventuais ordens de compra pertencem a funcionários da empresa, não a diretores.

Há uma fraude muito comum na China, em que ex-funcionários de empresas que fecharam emitem pedidos de compra, que depois não podem ser cobrados, porque o comprador, tecnicamente, não existe.

Além disso, é preciso verificar se a documentação é suficiente para constituir um contrato segundo a lei do país do importador. Pode ser que o país de destino não aceite ordens de compra assinadas por funcionários, por exemplo.


Medidas urgentes

Por força do alto grau de incerteza e de risco, eu normalmente sugiro uma série de medidas de emergência, tais como:

a) obter algo semelhante a uma consulta Serasa, relativa ao importador caloteiro (cada país tem seu sistema, e existem algumas empresas internacionais que também fazem essa busca);

b) ir visitar o cliente, fisicamente, para verificar se ele existe e quem são os diretores;

c) renegociar a dívida, ainda que com perda. O objetivo aqui é trocar a dívida antiga, informal, por uma dívida nova, que esteja descrita num contrato ou num título de crédito. Ou seja, que possa ser cobrada judicialmente no futuro.

Relembro Baden Powell, o fundador do escotismo. Ele dizia mais ou menos o seguinte: é muito bom saber se orientar no mato e conseguir retornar ao caminho, caso você fique perdido. Mas o mais importante é não se perder!

Mutatis mutandi, da próxima vez faça um contrato internacional! E encha de cláusulas de segurança.

Os honorários do advogado vão ficar mais baratos do que a passagem urgente para os Estados Unidos ou para a Índia.









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