quinta-feira, 29 de maio de 2014
Avanço chinês preocupa empreiteiras brasileiras | Valor Econômico
Só uma entre as muitas consequências malignas da MP 627 (agora convertida em lei).
O Brasil perde competitividade para competir no exterior, porque a Receita Federal tributa aqui o lucro provável que a empresa pode ou não, um dia, receber quando trabalha no exterior.
Avanço chinês preocupa empreiteiras brasileiras | Valor Econômico: "Encontro Nacional do Comércio Exterior de Serviços"
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segunda-feira, 26 de maio de 2014
Repercussões do Marco Civil da Internet sobre contratos internacionais firmados com usuários brasileiros
O Novo Marco Civil da Internet, que deve
entrar em vigor no final de junho de 2014, é uma lei complexa, incluindo
políticas públicas, padrões técnicos e direitos do consumidor. A lei também
contém dispositivos preocupantes, que permitem que o Estado monitore de perto
usuários da internet e conteúdos publicados na internet, o que se parece com
censura.
Neste artigo, irei focar nos
dispositivos regulando direito internacional privado e contratos internacionais
relacionados com a internet.
Abordagem
geral
A lei brasileira sobre conflitos de
normas tem sido historicamente baseada no domicílio das partes contratantes.
Isto é, geralmente a lei brasileira será aplicada a contratos executados no
brasil e não será aplicada a contratos celebrados no exterior. A nacionalidade
das partes não é importante neste contexto.
No caso de contratos entre partes que
estejam fisicamente distantes, a lei brasileira estabelece que a lei do país de
residência daquele que faz a proposta deve ser a lei aplicável.
Uma vez que contratos via internet não
têm um lugar onde são assinados, e uma vez que a maior parte dos distribuidores
de software, aplicativos e outros serviços de internet não estão localizados no
Brasil, a aplicação das leis brasileiras irá geralmente pender para a lei do
país do distribuidor (considerando que o distribuidor – vendedor – é
tipicamente aquele que propõe os termos).
O governo brasileiro parece ter se
ressentido desta situação. A nova lei de internet reflete essa posição e adotou
um atalho legal para permitir o uso da lei brasileira em contratos celebrados
por meio de ambientes virtuais. O Marco Civil determina que sempre que um
terminal estiver localizado no Brasil, a residência legal da parte utilizando o
terminal também deve ser o Brasil. E que qualquer transação via internet (ou
troca de informações), realizada por meio de um terminal localizado no Brasil
deve estar sujeita à lei brasileira.
Terminal, na definição jurídica, é
qualquer dispositivo capaz de acessar internet. A partir de telefones celulares
para processadores e servidores pesados.
Limites
para a aplicação da lei brasileira a terminais localizados no Brasil
O uso de leis brasileiras sobre
terminais localizados no Brasil é, em teoria, restrito aos atos de coleta,
manutenção e uso dos dados do usuário. E a lei brasileira deverá ser aplicada
especificamente no que concerne a privacidade e a proteção contra uso não
autorizado (incluindo a venda de informações para agências de publicidade,
espionagem, e busca de dados por governos estrangeiros.
Se o escopo do uso da legislação
brasileira fosse limitado aos temas acima, isso significaria que os termos dos
acordos comerciais deveriam estar sujeitos às leis sobre conflito de leis
usuais, o que significa que o uso do direito estrangeiro seria permitido.
Esta conclusão, no entanto, não é
segura.
Por um lado, porque outra parte da lei
menciona que a aplicação das leis consumeristas brasileiras também é
mandatória.
Também, a lei pode ser usada pelo
governo para justificar a taxação das vendas e licenciamento de software no
Brasil.
Além disto, vários princípios
estabelecidos na lei foram redigidos de forma a soar como sendo questões “interesse
coletivo e segurança nacional”. Sempre que uma norma é considerada como sendo
relevante para a segurança nacional, ela atrairá a aplicação da lei brasileira.
Isto significa que algumas cláusulas
dominantes em termos de uso padrão, como uma cláusula que permite ao vendedor
cobrar diretamente do cartão de crédito do comprador, pode ser considerada
ilegal no Brasil, porque a legislação brasileira é muito protetiva no que
concerne o crédito do consumidor, e porque a aplicação das leis consumistas
brasileiras pode ser considerada como uma questão de segurança nacional e de
interesse público.
Limitações
à escolha do foro e arbitragem
O projeto de lei também estabelece que
os acordos de massa firmados via internet não podem excluir fórum brasileiro.
Ou, em outras palavras, a lei proíbe que os fornecedores estrangeiros atraiam a
solução de litígios para seus países de origem (ao Facebook não seria permitido
escolher os EUA como o fórum preferencial para a resolução de litígios, por
exemplo).
Não está claro se esta disposição
impedirá o uso da arbitragem, ou se o uso da arbitragem nesses casos deve
seguir algumas disposições especiais que já são aplicáveis aos contratos de
consumo doméstico (basicamente, a necessidade de uma cláusula bem destacada,
com letras em negrito).
Consequências:
Fechamento de sites e de subsidiárias no Brasil
As consequências da não-conformidade com
as regras de privacidade descritas no projeto de lei são terríveis: uma multa
de até 10% da receita bruta do grupo econômico responsável pela aplicação
(pense em 10% das receitas mundiais de Angry Birds, ou, novamente, Facebook).
O projeto de lei prevê, claramente, que
as multas podem ser cobradas contra as subsidiárias locais das empresas, e até
mesmo contra quaisquer ativos ou empresas e distribuidores relacionados no
Brasil.
A lei não menciona de forma clara, mas o
encerramento das atividades de um site também é uma possibilidade (é importante
notar que até mesmo sites famosos como YouTube foram desligados no Brasil, há
alguns anos).
Conflitos
com as convenções internacionais. Possível inconstitucionalidade.
Alguns aspectos do Marco Civil violam os
acordos internacionais de proteção de privacidade. Muitos desses acordos não
foram ratificados pelo Brasil, mas são aplicáveis nos países em que o
fornecedor do aplicativo está localizado. Em especial, o Marco Civil determina
que os vendedores de servidores de internet ou aplicativos devem cooperar com
as autoridades brasileiras e compartilhar informações sobre seus clientes com a
polícia e os tribunais brasileiros.
Além disso, a aplicação de sanções às
subsidiárias locais que não praticaram qualquer atividade ilegal por si só pode
ser considerado inconstitucional, uma vez que a Constituição brasileira proíbe
a penalização de pessoas inocentes.
A lei internet brasileira é controversa
e, possivelmente, será causa de batalhas em tribunais a respeito de sua
validade vis a vis as convenções
internacionais, bem como a respeito de sua constitucionalidade. Vamos observar
atentamente como os princípios e regras descritas na lei serão aplicados.
Leia também:
- Contrato internacional de distribuição de software - cláusulas importantes
- Conselhos para o jovem engenheiro que montou uma Start-up e vai receber investimento internacional
- Cláusulas essenciais dos contratos internacionais de compra e venda
- 0% de Imposto de Renda na importação de serviços técnicos - se você pagar ao país certo
- Repercussões do Marco Civil da Internet sobre contratos internacionais firmados com usuários brasileiros
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sexta-feira, 23 de maio de 2014
Problemas práticos com a nova lei brasileira sobre internet (Marco Civil da Internet) - 1
Espero que a imagem
ilustrando o post ajuda a explicar do que esta lei realmente se trata: censura
(e impostos, mas vamos chegar lá depois).
Vou começar com
algumas conversas que tive logo depois que a lei entrou em vigor. Um artigo
mais longo e detalhado virá seguir.
Conversa 1.
Oi Adler -
Oi espero que esteja bem. Eu gostaria de te pedir um velho favor.
Como você deve se lembrar, eu trabalho para uma Entidade Nacional
Norte-Americana que está muito preocupada com a privacidade na e as
comunicações via Internet. Temos um site disponível para os brasileiros.
Estamos tentando ter uma ideia de como o novo Marco Civil vai impactar o
nosso negócio e quais as mudanças que precisamos fazer (se houver). Eu não
tenho certeza se isso cai dentro de sua área de especialização. Se não, você
poderia recomendar alguém com que eu pudesse falar?
Nick F.
---------
Nick,
Você sabe que pode sempre contar comigo.
Estou estudando a nova lei agora. Estou focando nos dispositivos sobre
conflito de leis (que têm aplicação obrigatória sob lei brasileira em alguns
casos) e nas suas disposições tributárias.
Podemos falar sobre isso, se quiser. Além disso, vou publicar um post no
blog nos próximos dias.
Atenciosamente,
Adler
---------
Adler,
+ nosso conselheiro
jurídico de operações, Matt.
Obrigado pelo retorno.
Embora estejamos interessados em todos os aspectos da lei (incluindo
dispositivos tributários), o que estamos mais preocupados agora (me corrija se
eu estiver enganado, Matt) é como esta lei irá impactar a coleta, utilização,
armazenamento e processamento de dados pessoais, ações para as quais a lei
parece determinar que o consentimento dos usuários é necessário.
Dependendo da interpretação deste texto, a operação de websites no
Brasil poderia se tornar muito difícil. Você tem alguma ideia a este respeito?
Talvez a pergunta mais adequada seja, alguém no Brasil tem ideia sobre o
significado disso?
Para a sua informação - Nós ainda não temos uma empesa constituída no
Brasil, mas é algo que estamos considerando fazer no futuro próximo.
Agradeço novamente,
N.F.
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Nick,
Para ser honesto, eu não tenho muita certeza. A lei é extremamente mal
elaborada.
O Artigo 7 institui limitações pesadas sobre o uso de informações do
cliente.
O Artigo 8 º diz que a exclusão da jurisdição brasileira não é permitida
em "contratos de Internet", mas não está claro se o uso da arbitragem
poderia contornar esta proibição.
Finalmente, o artigo 11 determina o uso da lei brasileira, basicamente,
sempre que houver coleta de informações do consumidor. No entanto, não está
claro se:
i) a arbitragem poderia contornar isso;
ii) a celebração de um contrato em separado,
especialmente um contrato comercial, seria suficiente para permitir o uso de
uma lei estrangeira;
iii) se isso tem qualquer aplicação prática, uma vez que:
a) é improvável que a brasileira escolha tribunais
locais para processar empresas e websites com sede no exterior. e
b) as normas sobre conflito de leis brasileiras
indicariam uma abordagem diferente, e não fica claro qual a regra (as gerais ou
esta) será aplicada em um caso determinado.
Além disso, a lei menciona que registros do uso das informações por
aplicativos estrangeiros deve ser mantido por provedores de serviços
localizados no Brasil. Suponho que esta norma tem por objetivo atingir grandes
empresas de Telecom ou de Telefonia, que vendem aplicativos no Brasil, entre
outros.
Mas eu não sei como isso se traduziria em mercados de massa, se você levar
em conta o uso da internet em desktops.
Estou aberto a discutir esse assunto por telefone, sem custo. Caso você
sinta que você precisa de um parecer jurídico, podemos discutir isso.
Posso publicar esta conversa no meu blog, sem mencionar o seu nome? Isso
ajudaria muito.
Atenciosamente,
Adler
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Adler
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Correto.
Precisamos entender o que qualifica um “usuário”? Alguém que
simplesmente “usa” o site sem o registro de uma conta, ou apenas alguém que se
registra no nosso site (situação em que poderíamos obter um “acordo” até certa
medida).
Precisamos entender o que é PI para tais usuários casuais e usuários
registrados.
Precisamos de entender cookies sobre usuários.
Mas sim. Esta lei parece ser difícil, senão impossível, de ser cumprida.
Matt M.
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terça-feira, 20 de maio de 2014
Empresas determinam as leis internacionais? O acordo entre EUA e União Europeia
Acabo de ler o artigo abaixo. Devo dizer que ele é paranóico e tem um viés muito de esquerda (o que, a meu ver, já é um indicativo de sua falta de qualidade).
Mas, por trás da ignorância do autor, ele traz uma intuição correta: as regras do comércio internacional são definidas pelas empresas que atuam no comércio internacional.
Todo o meu trabalho como advogado internacional pode se resumir a tirar os governos do caminho. Tornar os estados (governos) irrelevantes. Aplicar somente as leis do comércio, e nenhuma outra. Isso se faz via arbitragem, escolhas de foro, uso de subsidiárias em países variados e outros "tricks of the trade".
"A regra número um é sempre proteger a família"
Atualmente, restrições ambientais, tributárias e relativas a direito do consumidor são as que mais interferem no livre comércio. Meu trabalho é combatê-las, de modo que as pessoas possam comprar e vender o que quiserem, sem ter que estudar a lei de centenas de países diferentes.
Desejo muita sorte ao TAFTA! (links aqui e aqui)
TAFTA: EMPRESAS MULTINACIONAIS DOS EUA E DA EUROPA SUBSTITUIRÃO O ESTADO
Tafta: EUA e UE negociam em segredo um dos tratados mais importantes da história
O tratado que a União Europeia discute com os Estados Unidos desde meados de 2013 só emergiu agora na campanha eleitoral para as eleições europeias.
Por Eduardo Febbro, de Paris
"Sob os critérios das multinacionais, por trás das cortinas, em segredo, sem que os cidadãos conheçam seu conteúdo nem possam opinar ou decidir sobre ele: esse é o indolente marco no qual a União Europeia e os Estados Unidos estão negociando um dos tratados de livre comércio mais inéditos da história humana: o Tafta, Trans-Atlantic Free Trade Agreemen.
Apesar de sua importância e dos interesses colossais que estão em jogo, o tratado que a União Europeia discute com os Estados Unidos desde meados de 2013 só emergiu agora na campanha eleitoral para as eleições europeias que serão realizadas entre 22 e 25 de maio. O Tafta é, contudo, um dos mais amplos e decisivos acordos comerciais da história: diz respeito a 800 milhões de pessoas e a duas potências que, juntas, representam mais de 40% do PIB mundial e um terço das trocas comerciais do planeta.
Trata-se, em resumo, de constituir um gigantesco mercado transatlântico regido por normas comuns entre dois sócios que, ainda que pertençam à esfera ocidental, não funcionam nem com os mesmos valores, nem com a mesma jurisprudência.
Trata-se, em resumo, de constituir um gigantesco mercado transatlântico regido por normas comuns entre dois sócios que, ainda que pertençam à esfera ocidental, não funcionam nem com os mesmos valores, nem com a mesma jurisprudência.
O Tafta – também é conhecido como TTIP, PTCI ou GMT – aponta para a criação de normas convergentes no campo social, técnico, ambiental, de segurança, para a solução de diferenças, acesso a medicamentos, justiça, comércio, legislação trabalhista, proteção de dados digitais, regulação das finanças e educação. O problema central reside em saber a partir de que parâmetro se fixarão essas regras comuns, ou seja, do europeu, muito mais protetor, ou do norte-americano.
O tratado de livre comércio entre Washington e Europa tem dois vícios maiores: um é o fato de ser negociado às escondidas, de costas para a opinião pública; o outro é que sua filosofia prevê que as legislações dos dois blocos respondam às normas de livre comércio estabelecidas pelas grandes empresas europeias e norte-americanas.
Seus partidários, reunidos sob as bandeiras da direita liberal, argumentam que o Tafta trará crescimento e desenvolvimento, que sem ele a Europa se tornará um anão comercial. Os defensores do Tafta sustentam que, uma vez aplicado, o acordo faria Estados Unidos e Europa ganharem 0,05 pontos de crescimento por ano. Seus adversários, principalmente os ecologistas, tudo o que está à esquerda do Partido Socialista e a extrema-direita da Frente Nacional alegam justamente o contrário. A presidenta da Frente Nacional, Marine Le Pen, qualifica o tratado como “uma máquina de guerra ultraliberal, antidemocrática, antieconômica e antissocial”. O eurodeputado ecologista Yannick Jadot vê nas negociações em curso “o fim do projeto europeu, o fim de nossa capacidade para decidir nossas opções, a impugnação de nossa soberania”.
Essa negociação transatlântica está ocorrendo na mais absoluta opacidade. O que se conhece até agora veio à luz pela internet e por acaso. Isso leva Raquel Garrido, candidata da Frente de Esquerda para as próximas eleições europeias, a dizer que “a oligarquia avança de costas para os povos”. O cientista político belga, Raul Marc Jennar, escreveu um ensaio sobre o Tafta (“Le grande marché transatlantique. La menace sur les peuples d’Europe” – O grande mercado transatlântico. A ameaça sobre os povos da Europa). Para Jennar, esse tratado tem uma meta clara: consiste em confiar às empresas privadas a possibilidade de decidir normas sociais, sanitárias, alimentares, ambientais, culturais e técnicas. Substituir o Estado é a intenção declarada das grandes multinacionais.
É lícito reconhecer que não faltam razões aos críticos o Tafta. Há pontos decididamente polêmicos. Um dos componentes mais polêmicos do acordo que veio a público até agora é o chamado ISDS (Investor-State Dispute Settlement). Esse mecanismo, que pretende a solucionar os conflitos envolvendo empresas, outorga a essas últimas o direito de atacar um Estado cuja política representa um obstáculo para seu desenvolvimento comercial. Em caso de litígio, por exemplo, um tribunal multinacional privado como o ICSID pode aceitar uma queixa de uma multinacional contra França, Alemanha ou a União Europeia. O ICSID é um organismo dependente do Banco Mundial baseado em Washington que tem em seu currículo algumas decisões polêmicas.
Dois exemplos: em 2012, o ICSID condenou o Equador a pagar cerca de 2 bilhões de dólares à empresa "Occidental Petroleum" porque o país parou de “colaborar” com a petroleira. Em 2010 e 2011, a multinacional "Philip Morris" recorreu a esse mesmo sistema de arbitragem para reclamar de Uruguai e Austrália uma indenização de vários bilhões de dólares porque esses dois países haviam lançado "uma campanha contra o tabaco".
Realidades e fantasmas convergem em uma grande discussão que, até o momento, se plasmou em torno de quatro ciclos protagonizados por Karel De Gucht, a comissária europeia encarregada do comércio, e Mike Forman, o representante norte-americano. O senador socialista Henri Weber situa o Tafta como uma espécie de batalha mundial pelas normas: “se os norte-americanos e os europeus se entenderem, suas normas se imporão como normas mundiais. Do contrário, será Pequim ou os países emergentes que fixarão as suas”.
Entre os segredos da negociação do tratado transatlântico há muito mais do que comércio em jogo. Está em questão o modo pelo qual os países vão se relacionar, um modelo para construir uma sociedade. Por um lado, está o modelo norte-americano, o qual o prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz chama de “fundamentalismo mercantil”. Por outro, o europeu, que o filósofo e ensaísta Patrick Viveret quer resguardar porque, escreve: “a Europa deve seguir sendo o continente do bom viver”.
O tratado de livre comércio entre Washington e Europa tem dois vícios maiores: um é o fato de ser negociado às escondidas, de costas para a opinião pública; o outro é que sua filosofia prevê que as legislações dos dois blocos respondam às normas de livre comércio estabelecidas pelas grandes empresas europeias e norte-americanas.
Seus partidários, reunidos sob as bandeiras da direita liberal, argumentam que o Tafta trará crescimento e desenvolvimento, que sem ele a Europa se tornará um anão comercial. Os defensores do Tafta sustentam que, uma vez aplicado, o acordo faria Estados Unidos e Europa ganharem 0,05 pontos de crescimento por ano. Seus adversários, principalmente os ecologistas, tudo o que está à esquerda do Partido Socialista e a extrema-direita da Frente Nacional alegam justamente o contrário. A presidenta da Frente Nacional, Marine Le Pen, qualifica o tratado como “uma máquina de guerra ultraliberal, antidemocrática, antieconômica e antissocial”. O eurodeputado ecologista Yannick Jadot vê nas negociações em curso “o fim do projeto europeu, o fim de nossa capacidade para decidir nossas opções, a impugnação de nossa soberania”.
Essa negociação transatlântica está ocorrendo na mais absoluta opacidade. O que se conhece até agora veio à luz pela internet e por acaso. Isso leva Raquel Garrido, candidata da Frente de Esquerda para as próximas eleições europeias, a dizer que “a oligarquia avança de costas para os povos”. O cientista político belga, Raul Marc Jennar, escreveu um ensaio sobre o Tafta (“Le grande marché transatlantique. La menace sur les peuples d’Europe” – O grande mercado transatlântico. A ameaça sobre os povos da Europa). Para Jennar, esse tratado tem uma meta clara: consiste em confiar às empresas privadas a possibilidade de decidir normas sociais, sanitárias, alimentares, ambientais, culturais e técnicas. Substituir o Estado é a intenção declarada das grandes multinacionais.
É lícito reconhecer que não faltam razões aos críticos o Tafta. Há pontos decididamente polêmicos. Um dos componentes mais polêmicos do acordo que veio a público até agora é o chamado ISDS (Investor-State Dispute Settlement). Esse mecanismo, que pretende a solucionar os conflitos envolvendo empresas, outorga a essas últimas o direito de atacar um Estado cuja política representa um obstáculo para seu desenvolvimento comercial. Em caso de litígio, por exemplo, um tribunal multinacional privado como o ICSID pode aceitar uma queixa de uma multinacional contra França, Alemanha ou a União Europeia. O ICSID é um organismo dependente do Banco Mundial baseado em Washington que tem em seu currículo algumas decisões polêmicas.
Dois exemplos: em 2012, o ICSID condenou o Equador a pagar cerca de 2 bilhões de dólares à empresa "Occidental Petroleum" porque o país parou de “colaborar” com a petroleira. Em 2010 e 2011, a multinacional "Philip Morris" recorreu a esse mesmo sistema de arbitragem para reclamar de Uruguai e Austrália uma indenização de vários bilhões de dólares porque esses dois países haviam lançado "uma campanha contra o tabaco".
Realidades e fantasmas convergem em uma grande discussão que, até o momento, se plasmou em torno de quatro ciclos protagonizados por Karel De Gucht, a comissária europeia encarregada do comércio, e Mike Forman, o representante norte-americano. O senador socialista Henri Weber situa o Tafta como uma espécie de batalha mundial pelas normas: “se os norte-americanos e os europeus se entenderem, suas normas se imporão como normas mundiais. Do contrário, será Pequim ou os países emergentes que fixarão as suas”.
Entre os segredos da negociação do tratado transatlântico há muito mais do que comércio em jogo. Está em questão o modo pelo qual os países vão se relacionar, um modelo para construir uma sociedade. Por um lado, está o modelo norte-americano, o qual o prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz chama de “fundamentalismo mercantil”. Por outro, o europeu, que o filósofo e ensaísta Patrick Viveret quer resguardar porque, escreve: “a Europa deve seguir sendo o continente do bom viver”.
Os lobbies financeiros trabalham arduamente para derrubar um dos já escassos territórios onde viver bem, ter muitas férias, gozar da proteção do Estado, do amparo de certos valores humanos e republicanos, trabalhar sem morrer na tentativa, é a espinha dorsal sobre a qual repousa a vida de milhões de indivíduos."
FONTE: escrito por Eduardo Febbro e publicado no site "Carta Maior" com tradução de Louise Antônia León (http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/Tafta-EUA-e-UE-negociam-em-segredo-um-dos-tratados-mais-importantes-da-historia/6/30953).
FONTE: escrito por Eduardo Febbro e publicado no site "Carta Maior" com tradução de Louise Antônia León (http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/Tafta-EUA-e-UE-negociam-em-segredo-um-dos-tratados-mais-importantes-da-historia/6/30953).
Marcadores:
Comércio Internacional,
lei aplicável,
tafta
segunda-feira, 12 de maio de 2014
ConJur - Segunda Leitura: Notas sobre o estudo e aplicação do Direito na China
quarta-feira, 7 de maio de 2014
MP 627: pacotão tributário é aprovado pelo Congresso | InfoMoney
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