Por Assis Moreira | De Genebra
GENEBRA - A presidente Dilma Rousseff e a primeira-ministra alemã, Angela Merkel, vão discutir, na semana que vem, como desbloquear um acordo para evitar bitributação em matéria de impostos de renda e de capital, decisão que se arrasta há anos e pesa nos negócios bilaterais.
O impasse é importante, porque a Alemanha defende um modelo de acordo pelo qual a tributação se baseia no domicilio do investidor, enquanto a prática brasileira é que a taxação seja feita no local do investimento. A proposta alemã significaria para o Brasil perder bilhões de dólares de arrecadação, o que é considerado irrealista.
O governo brasileiro sinaliza que está aberto a uma negociação que atenda aos dois lados, levando em conta a importância estratégica do tema para a expansão da atividade econômica bilateral. Empresários brasileiros e alemães têm trabalhado para chamar atenção de Dilma e Merkel sobre o tema e esperam que, a partir de visita da presidente brasileira à Alemanha, possa haver algum movimento.
O Brasil e a Alemanha tinham um acordo para evitar bitributação que vigorou 30 anos, até ser suspenso (denunciado, na linguagem diplomática) em 2005 pelo governo social-democrata de Gerhard Schroeder.
Os socialistas de Berlim argumentaram na época que desejavam aplicar um acordo mais moderno, propondo o modelo da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade que reúne os países desenvolvidos.
Para se ter uma ideia do que isso significa em termos de perda de arrecadação para o Brasil, basta ver que 1.300 empresas da Alemanha estão instaladas no país, incluindo todas as grandes companhias. O faturamento global dessas companhias representa algo em torno de 7% do PIB brasileiro.
Até agora, nenhum outro país denunciou acordo idêntico com o Brasil, entre eles os Holanda e Áustria, vizinhos da Alemanha. Segundo fontes, as grandes empresas alemãs estão tranquilas, porque suas operações são feitas não diretamente entre matriz e a filial brasileira, mas por meio de subsidiárias instaladas em terceiros países.
Para o embaixador brasileiro em Berlim, Everton Vieira Vargas, os duplamente afetados pela falta do acordo são os executivos, que têm de pagar impostos tanto no Brasil como na Alemanha, e também as pequenas e médias empresas (PMEs). Segundo o embaixador, é uma situação difícil, porque a expansão das relações econômicas passa pelas pequenas e médias empresas, por exemplo com joint ventures, e será necessário o entendimento para evitar a bitributação.
As pequenas e médias empresas alemães criam 90% dos empregos no país e querem entrar no mercado brasileiro de 200 milhões de habitantes, na estratégia de ocupar novos mercados. Ainda mais que o mercado alemão, de 80 milhões de habitantes, está diminuindo, com perda líquida de população e, portanto, de consumidores.
A participação alemã no total de investimentos diretos estrangeiros no Brasil vem declinando. O país passou de terceiro maior investidor em 2001 para 13º em 2011. No ano passado, em todo caso, várias companhias anunciaram investimentos importantes no país.
A Volkswagen anunciou projeto de US$ 2 bilhões, provavelmente em Pernambuco, a Basf, investimento de US$ 910 milhões na área de ácido acrílico, a ZF outros US$ 420 milhões em autopeças, e a E.ON, investimento de US$ 450 milhões, numa joint venture com a MPX , de Eike Batista.
Além disso, a Würth anunciou investimentos de US$ 300 milhões na área de ferramentas e produtos químicos, a Enecon, US$ 238 milhões em energia eólica, e a Linde, US$ 131 milhões na área de gás. A Siemens, por sua vez, destinará US$ 50 milhões para um laboratório no Parque Tecnológico da Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro.
O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) pode abrir novas oportunidades aos investidores alemães. Como o resto do mundo, o empresariado alemão tem grande interesse em participar, em particular, dos projetos de infraestrutura previstos no Brasil para a Copa de Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro de 2016.
O interesse pela assinatura de um acordo para evitar bitributação agora também é das empresas brasileiras, devido à internacionalização As principais empresas brasileiras presentes na Alemanha são Sadia, Itaú, Banco do Brasil, TAM, Sabó (atua no mercado alemão sob o nome Kako), Tupy e Votorantim.
No ano passado, a Braskem adquiriu duas fábricas de polipropileno na Alemanha. Este ano, a CSN anunciou a compra da siderúrgica alemã Stahlwerk Thüringen, investimento estimado em US$ 635 milhões.
No setor privado, certas fontes dizem que o Brasil não quer abrir mão de nada. Acham que as empresas estrangeiras prefeririam pagar os impostos no país de origem, porque seriam mais baixos que no Brasil, o que melhoraria a competitividade no mercado brasileiro. Negociadores admitem que será preciso muita vontade política e determinação para conciliar os interesses.
(Assis Moreira | Valor)
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