Atualização julho 2014: As regras mudaram de novo. Leia 0% de Imposto de Renda na importação de serviços técnicos - se você pagar ao país certo
OBS: Sugiro também a leitura de: Impostos na importação de software e serviços técnicos
Post original:
Em minha opinião, desde o Decreto de Abertura dos Portos às Nações Amigas não há uma notícia tão revolucionária:
O TRF da 4ª Região decidiu que a remessa de dinheiro ao exterior para pagamento de serviços prestados por estrangeiro é isenta de Imposto de Renda Retido na Fonte.
PARA ENTENDER
Como eu já havia explicado em minha Palestra sobre investimentos estrangeiros , via de regra os serviços prestados por estrangeiros (não residentes) no País estão sujeitos ao Imposto de Renda Retido na Fonte pela alíquota de 25%.
Ou seja, ao se dirigir ao banco para transferir 1.000 dólares para um programador canadense, em pagamento por serviços de criação de uma página da internet, o Brasileiro tinha duas opções:
*Enviar 750 dólares e deixar 250 no Banco, a título de imposto de renda devido pelo canadense ao Brasil
ou
*enviar os 1000 dólares e deixar 333 dólares no banco (sendo que estes 333 dólares corresponderiam a 25% da hipotética quantia de 1.333, utilizada apenas para fins de cálculo)
Obviamente, a situação era crudelíssima. Ou o prestador do serviço se conformava em receber somente 75% do combinado ou a empresa brasileira se conformava em pagar pelo menos 33% a mais pelo serviço.
Desentendimentos sobre esse ponto deram origem a conflitos sem fim, pois em muitos casos nenhuma das duas partes sabia dessa peculiaridade tributária. Não raramente as duas saíam no prejuízo.
TRATADOS DE NÃO BITRIBUTAÇÃO X GANÂNCIA DA RECEITA FEDERAL
Para fomentar investimentos mútuos, os países costumam celebrar Acordos para evitar a dupla tributação (Non-double taxation Agreements ou simplesmente Tax Treaties). Esse acordos evitam, por exemplo, que uma empresa pague imposto de renda duas vezes ao prestar serviços no exterior.
Vejam que, no caso acima, o programador sofreria bitributação, pois já teria recolhido o imposto de renda aos cofres brasileiros e ainda teria que pagar o imposto de renda no Canadá.
Contudo, Brasil e Canadá possuem um acordo para evitar a dupla tributação. Em teoria, problema resolvido, certo? Como o canadense não está no Brasil, só pagaria imposto de renda no Canadá.
Mas não tire conclusões precipitadas, caro leitor. A Receita Federal brasileira, talvez para celebrar a virada do ano 2000, publicou o Ato Declaratório Normativo número 1, no dia 05 de janeiro daquele ano.
Nesse famigerado e lendário Ato Normativo, a Receita interpretou os tratados para evitar a dupla tributação de forma bastante peculiar. Conseguiu concluir que os serviços constituiriam fontes de rendimento "indeterminadas", e por isso deveriam gerar o pagamento de Imposto de Renda Retido na Fonte, a despeito de os tratados dizerem literalmente o contrário (ou seja, que os pagamentos de serviços, por compor base do lucro, só seriam tributados no país sede do prestador de serviços, jamais no Brasil).
Consequência da ganância da Receita Federal: Perda de competitividade do Brasil.
Afinal, é realmente desestimulante para qualquer empresa investir num país onde os tratados internacionais não são respeitados. Principalmente se, para prestar serviços banais de assistência técnica da matriz para a filial é preciso recolher imposto de renda em dois países.
Mas eis que surge um raio de esperança:
O Tribunal Regional da Segunda Região decidiu, em março deste ano, que o Governo Brasileiro deveria manter o respeito às próprias leis e ao Direito Internacional. Ordenou que fossem cumpridos os tratados de bitributação. Sem xicanas. Sem falácias. Sem Imposto de Renda Retido na Fonte.
Ou seja, SEMPRE QUE UMA EMPRESA BRASILEIRA CONTRATAR SERVIÇOS TÉCNICOS ESPECIALIZADOS DE UM FORNECEDOR ESTRANGEIRO LOCALIZADO EM PAÍS COM O QUAL O BRASIL TEM ACORDO TRIBUTÁRIO, os pagamento serão ISENTOS DO IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE.
O QUE ISSO SIGNIFICA
Muito.
Significa que o Brasil tem a chance de se integrar ao chamado quarto setor, ou seja, à economia do conhecimento e da tecnologia.
Significa que empresas brasileiras poderão comprar e vender softwares altamente especializados, livremente.
Significa que a prestação de serviços de assistência técnica remota poderá ser contratada pelas empresas brasileiras junto às matrizes estrangeiras com muito menos ônus.
Significa que a Petrobrás, ao explorar o Pré-sal, poderá pagar menos pelos serviços técnicos que contrata da França, Suécia, Finlândia, etc.
(A propósito, minha natureza investigativa me fez ver que o processo que originou essa revolução foi movido justamente pela Total do Brasil, que é filial de uma gigante francesa da área de petróleo e energia.)
Significa, enfim, que comprar serviços estrangeiros está mais barato. Portanto, o Brasil precisará se modernizar e assumir sua posição como país pensante. Ou falir.
Vivez la révolution.
NOTAS
Se você gostou desse post, veja também: A tributação dos investidores estrangeiros no Brasil.
A disputa ainda será reapreciada pelo Superior Tribunal de Justiça. Precisamos ficar vigilantes.
Serviços de reparo ou atualização de veículos aéreos de combate prestados a partir de, digamos, França e Suécia, passariam a estar livres da bitributação.
A isenção só vale para os poucos países amigos em matéria tributária que já celebraram Tax Treaties com o Brasil. A lista está aqui
A importação de softwares e serviços ficará mais barata. Mas não se esqueçam de que é preciso estudar a aplicação do PIS/COFINS importação, eventualmente ISS, etc.
A remessa de pagamento a título de royalties está sujeita a regras inteiramente diferentes, com incidência da CIDE. A decisão não é, portanto, a panaceia. (Paris não foi feita em um dia)
Inteiro teor da decisão do STJ que confirmou a decisão original aqui.
Com base no seu artigo, posso concluir que, por exemplo: Uma empresa domiciliada no Brasil, a Empresa A contratou serviços técnicos a serem prestados pela Empresa B, que possui domicílio no Canadá, a empresa A do Brasil quando pagar a empresa B domiciliada no Canada, não irá reter o IR pois os paises possuem acordo. Você saberia informar o número do Tratado? Obrigada. Geovana g.macedo.b@gmail.com
ResponderExcluirCara Geovana,
ResponderExcluirSua conclusão está de acordo com a ideia geral.
Mas me permite algumas ressalvas: o post foi baseado numa decisão judicial. Ou seja, o entendimento não é pacífico e a Receita Federal, provavelmente, não aplicará automaticamente a decisão.
Especificamente em relação ao Canadá, há uma portaria (Portaria MF nº 199, de 13 de maio de 1986) do Ministério da Fazenda que regula a aplicação da Convenção de não bitributação Brasil Canadá(promulgada no Brasil pelo Decreto nº 92.318, de 23 de Janeiro de 1986).
Essa portaria traz vários entendimento que conflitam frontalmente com a decisão judicial. Por exemplo, define que os serviços técnicos serão tratados como Royalties, não como serviços.
Esse tipo de interpretação polêmica (para dizer o mínimo), foi justamente o que motivou a ação judicial sobre a qual comentei no post.
Reproduzo aqui os primeiros artigos da referida Portaria, para que você observe como a posição da Receita Federal diverge do entendimento mais recente do poder judiciário.
Abraços,
Adler
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étodos de aplicação da Convenção entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Canadá destinada a evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre a renda.
O Ministro de Estado da Fazenda, no uso de suas atribuições e tendo em vista o disposto na Convenção entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Canadá, destinada a evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre a renda, promulgada pelo Decreto nº 92.318, de 23 de janeiro de 1986, estabelece, no que respeita à tributação no Brasil, o seguinte:
1 - Os dividendos, lucros, juros, royalties e rendimentos de assistência técnica e de serviços técnicos de que tratam os artigos X, XI e XII da Convenção, quando provenientes do Brasil a pagos a uma sociedade residente ou domiciliada no Canadá, em decorrência de investimentos e contratos registrados no Banco Central do Brasil, estão sujeitos às seguintes alíquotas de imposto na fonte:
a) 25% (vinte e cinco por cento) no caso dos dividendos e lucros de que trata o artigo X, parágrafos 2 e 5, alínea b;
b) 10% (dez por cento) no caso dos juros de que trata o artigo XI, parágrafo 2, alínea a;
c) 15% (quinze por cento) no caso dos juros de que trata o artigo XI, parágrafo 2, alínea b;
d) 25% (vinte a cinco por cento) no caso dos royalties de que trata o artigo XII, parágrafo 2, alínea a;
e) 25%(vinte e cinco por cento) no caso dos royalties e rendimentos de assistência técnica e de serviços técnicos de que trata o artigo XII, parágrafo 2, alínea b, quando pagos a uma sociedade residente ou domiciliada no Canadá que possua direta ou indiretamente no mínimo 50% (cinqüenta por cento) do capital votante da sociedade pagadora, ou quando pagos por filial no Brasil à sua matriz no Canadá;
f) 15%(quinze por cento) no caso dos royalties e rendimentos de assistência técnica e de serviços técnicos de que trata o artigo XII, parágrafo 2, alínea b, quando pagos a qualquer outra sociedade residente ou domiciliada no Canadá.
Dr.Adles Martins,
ResponderExcluirBom dia
Por essa infinidade de decições drasticas, que muitos empresarios ortodoxos, vem buscando remédios juridicos para o pagamento de tributos vencidos e vincendos, remeto o nobre colega a Divida Externa Brasileira do DL 6019/43.Note que a existencia de levar economia tributaria a essas empresas.
PARABENS!!!gostei da matéria.
Caro Dr. Adler,
ResponderExcluirEstou com dúvida a respeito do anexo disponibilizado sobre a decisão judicial.
Seria possível esclarecer?
Neste anexo consta a seguinte decisão:
"ACÓRDÃO
Vistos e relatados os presentes autos em que são partes as acima
indicadas, decide a Terceira Turma Especializada do Tribunal Regional
Federal da 2a. Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, na
forma do Relatório e do Voto, que ficam fazendo parte do presente julgado.
Rio de Janeiro, de de 2011. (data do julgamento).
SANDRA CHALU BARBOSA
Juíza Federal Convocada
Relatora
marcos.s.jesus@gmail.com
Caro Marcos,
ResponderExcluirDesculpe, andei atualizando alguns links e acho que errei neste.
Agora o post já está com a decisão do STJ que confirmou a decisão original. Pode conferir.
Abs e boa sorte!
Obrigado,
ResponderExcluirmarcos.s.jesus@gmail.com
Olá, Parabéns pelo Blog! Em relação aos serviços prestados por artistas e desportistas, no entanto, os tratados normalmente prevêem que os tributos são devidos ao país no qual os serviços são executados, ainda que por meio de pessoas jurídicas... Concorda?
ResponderExcluirAida,
ExcluirObrigado pelo comentário.
Não concordo. Os tratados dizem que os serviços podem ser tributados pelos dois, não que serão tributados por um só.
Veja por exemplo o artigo 14 da convenção com a Holanda:
ARTIGO 14
Profissões Independentes
1. Os rendimentos obtidos por um residente em um Estado Contratante, pelo exercício de profissão liberal ou por outras atividades de natureza independente, só são tributados nesse Estado, a não ser que a remuneração por tais serviços ou atividades seja paga por sociedade residente do outro Estado Contratante, ou caiba a estabelecimento permanente ali situado. Nesse caso, os rendimentos podem ser tributados nesse outro Estado.
2. A expressão "profissão liberal" abrange, em especial, atividades independentes de caráter científico, técnico, literário, artístico, educacional ou pedagógico, bem como as atividades independentes de médicos, advogados, engenheiros, arquitetos, dentistas e contadores.
Abs.
Adler
OBS: As respostas são meramente informativas. Não são e não valem como consultoria jurídica. Consulte sempre um advogado.
Olá,
ResponderExcluirPoderia informar a normativa que ampara essa decisão de não cobrar IR por importação de serviços?
Obrigado.
Raul,
ExcluirEste post fala de uma decisão judicial. Mas o assunto já caminhou muito. Já houve novas decisões e também normas da Receita.
Por favor me mande um email: contato@adler.net.br
Abs.
Adler