segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

EM QUE PONTO ESTAMOS EM RELAÇÃO A TRUST, HOLDING E OFFSHORE?

 Vamos pensar numa família que tenha 10 milhões de reais. Metade em imóveis e metade em dinheiro.


Se os imóveis estiverem em nome do patriarca:

·        Rendimentos: IR de 27,5%

·        Na morte – ITCMD de 8% (em breve, 16%).

 

Se os investimentos estiverem também em nome do patriarca

·        Rendimentos: tributação de 0% a 15%, em média.

·        Na Morte:  ITCMD de 8% (em breve, 16%)

 

Outra desvantagem é ter tudo em reais. Em relação ao dólar, a riqueza diminui uns 5% ao ano.

Altamente ineficiente.

 

Melhor seria:

·        Metade do patrimônio dolarizado.

·        Zero de imposto sobre os rendimentos financeiros.

·        Zero de imposto sobre a herança total (imóveis + financeiro).

Dá pra chegar nisso? Vamos ver.

Em relação ao dinheiro.

Uma boa carteira de investimento em dólar, em papéis que não paguem imposto, resolveria a parte da dolarização.

A carteira na pessoa física pode ser feita de modo a não pagar IR nunca (só no saque ou na morte).

Porém, pela lei nova que está para sair, essa carteira ainda pagaria imposto de herança.

Resolveríamos 2 de 3 problemas, mas não seria uma solução perfeita.

Além disso, correr-se-ia o risco de ter que fazer inventário no exterior, coisa que brasileiro ojeriza.


Como fazer para não ter inventário, não pagar imposto de herança e também não pagar IR sobre os rendimentos?

Para não ter inventário, é preciso criar uma estrutura que nunca morre. Algo como uma offshore ou um trust.

 

Era fácil criar essas estruturas até 2022, mas a lei de offshore criou o conceito de entidade controlada, que complicou as coisas.

Se o patriarca criar uma offshore sozinho e colocar todos os investimentos nela, a nova lei de offshore pode obrigá-lo a recolher 15% de IR todo ano. Isso mata o rendimento.

 

Existem meios de criar uma offshore com a participação de outras pessoas ou de entidades financeiras, de modo que ela não seja considerada uma entidade controlada e não pague esses 15% anuais. Mas vamos estudar essa via outra hora.

 

Neste momento, o que queremos é uma brecha na lei que permita criar uma offshore só da família, sem a participação de mais ninguém; e que não pague impostos anualmente.

 

Essa brecha existe?

SIM.

Porém, dá um trabalhinho.

 

Será preciso criar uma offshore num país que não seja paraíso fiscal.

Essa offshore precisaria ter:

·        atividade operacional própria; ou

·        ser dona de uma empresa operacional.

 

A estrutura precisa ter 60% da Receita vinda de atividade operacional e no máximo 40% vinda de atividades financeiras.

 

No nosso exemplo, a família com 5 milhões de reais investidos provavelmente obteria rendas de 500 mil reais por ano por meio do mercado financeiro.

Isso quer dizer que ela precisaria de 750 mil reais por ano de faturamento bruto (ou de dividendos recebidos de empresa operacional) para contrabalançar a renda especulativa.

500 mil  é 40% da receita.

750 mil é 60% da receita.

 

Vamos por partes.

Imóveis.

Se essa família colocar os imóveis que estão no Brasil dentro de uma holding brasileira, controlada pela offshore, essa holding deve ter um lucro anual de uns 250 mil reais.

Esse lucro “sobe” para a offshore e já compõe parte da receita bruta. Ficariam faltando 500 mil reais de faturamento para chegar ao nosso mínimo de 750 mil operacionais por ano.

Os 500 mil reais faltantes são apenas faturamento, não lucro. Isso quer dizer que a empresa pode movimentar bastante dinheiro, com margem baixa, e cumprirá a meta.

ESTE É O MAIOR PROBLEMA! As famílias não querem misturar investimentos financeiros, cujo fim é a preservação do patrimônio, com atividades operacionais.

 

Nesse tema, precisamos reconhecer que o cobrador de impostos é paciente e ardiloso.

Ele aposta que o brasileiro será impulsivo e não quererá explorar uma brecha óbvia de lei.

Nosso objetivo é convencer o cliente a ter mente sóbria e sangue frio.

 

Para ajudá-lo, vamos sugerir atividades operacionais que sejam, na medida do possível, seguras e controláveis.

 

Algumas ideias:

·       
Trading de alta frequência com criptoativos (comprar e vender com alta frequência, com lucro mínimo). A venda pode ser feita até para membros da família, ou repetidamente para parceiros confiáveis;

·        Comprar e revender bens digitais extremamente líquidos, como certificados de presente (gift certificates);

·        Operação automatizada de dropshipping para bens de consumos de giro rápido, como papel higiênico ou xampu.

 

Note que, nessas operações, a família precisa girar várias vezes um capital semente de 50 mil reais. Comprar por 50 mil e revender por 51 mil.  Não é preciso comprometer um capital de 500 mil.

O importante é que haja um faturamento total de 500 mil ao longo de um ano. O risco é bastante gerenciável.

 

Outra opção seria transferir negócios que a família já tem no Brasil para a offshore.  Bons candidatos são a exportação de software ou de serviços de programação.

 

Em todo o caso, se a família não quiser a atividade operacional de jeito nenhum, seria possível rearranjar os investimentos para que o rendimento financeiro fosse limitado a 40%.

Ficaria assim:

 

·        252 mil (aluguel) ---   60% da renda

·        168 mil (ganho financeiro) – 40% da renda (referente a 1.680.000,00 reais)

·        Capital não aplicado: 3.320.000 --- teria que ser aplicado no exterior diretamente na pessoa física do patriarca.

 

Esse capital de três milhões e trezentos poderia ser dividido mais ou menos assim:

·        80% - Aplicação financeira de longa maturação

·        20% - Seguro de vida contratado no exterior, que ficará reservado para pagar o ITCMD.

 

Essa solução não é a mais perfeita. Mas já é um bom ponto de partida para que a família comece a internacionalizar o patrimônio e criar um sistema de proteção contra o imposto de herança.

 

Para melhorar um pouco, podemos incluir pequenas doações anuais desses investimentos, feitas do pai para os filhos.  Em estados como SP, há uma isenção anual de imposto de doação bem relevante, de quase 90 mil reais por ano.

Com uma estratégia bem planejada, seria possível doar a maior parte do patrimônio a dois filhos, sem imposto, ao longo de 10 anos.

Finalmente, teríamos que resolver apenas o imposto de herança sobre a offshore.

Isso se pode fazer por meio de técnicas contábeis que reduzem o valor patrimonial da offshore, ou por meio do chamado turismo tributário, que é o uso estratégico do instituto da mudança de domicílio fiscal.

Na estratégia acima, o custo total de ITCMD seria muito pequeno. Totalmente coberto pelo seguro. E a família teria usufruído de bom rendimento em dólar, ao longo da vida do patriarca.

A família economizaria, só de ITCMD, cerca de 678 mil reais.
Se a estrutura offshore custar 3 mil dólares por ano, por 20 anos (ambas são estimativas bem altas) a economia líquida só com ITCMD seria de 330 mil reais.

Se adicionarmos os ganhos com a variação do dólar e os efeitos do adiamento do IR sobre investimentos, o benefício total para a família ficara na casa de alguns milhões de reais.

É um plano totalmente viável.

 

Num próximo artigo, explicarei sobre as outras possibilidades:

·        Uso de fundos de investimento;

·        Participação indireta na offshore;

·        Empresa controlada mas neutralizada por prejuízos contábeis.

terça-feira, 2 de julho de 2024

Entrevista com advogado em negócios internacionais - Paulo Rage


Neste vídeo tive a honra de conversar com meu grande amigo, Paulo Rage. Ele foi meu colega na UFMG e hoje é sócio do Mayer Brown, um renomado escritório internacional de advocacia. Atualmente, reside em Dubai, de onde cuida de negócios com o Oriente Médio e a África. A profissão do advogado em negócios internacionais é pouco divulgada no Brasil. Nesta entrevista, mostro a realidade dessa carreira tão promissora e interessante.

segunda-feira, 3 de junho de 2024

A melhor solução para montar holding de investimento, após a lei das offshore:


Minha sugestão:

1) Empresa localizada em país com tributação favorável, mas que não seja paraíso fiscal;
+
2) com atividade operacional estável e pouco lucrativa.


A empresa que está localizada no Uruguai, em Luxemburgo ou em alguns poucos outros países pode ter, na prática, uma tributação muito pequena. Mesmo assim, essa empresa não se enquadraria no conceito de empresa localizada em paraíso fiscal. Ou seja, escaparia de um dos requisitos da nova lei das offshore.

Se essa empresa tiver faturamento com atividades operacionais rotineiras, ela escapará da nova lei das offshore.

Essas atividades não precisam ser lucrativas. Apenas gerar faturamento (entrada de dinheiro), mesmo com lucro quase zero.

Ex: Revender tijolos.
Ex2: Revender criptomoedas (em alguns casos).

O que vocês acham?

segunda-feira, 31 de outubro de 2022

A advocacia internacional na era Lula 3


 

Consequências do governo Lula 3 para a Advocacia Internacional

Lula foi eleito presidente

Eis o que acredito que os advogados internacionais devem esperar do seu governo.

Premissas: A campanha do Lula não divulgou um plano detalhado de governo, nem uma lista de possíveis ministros. A análise foi feita tendo por base compromissos partidários do PT, sobretudo os divulgados em documentos do “Grupo de Puebla” e “Foro de São Paulo” e nas resoluções do partido (v.g.: 6º. congresso nacional do partido)

 


1)      PRINCIPAIS IMPACTOS: TRIBUTAÇÃO DE HERANÇAS E DE SOCIEDADES OFFSHORE.

É pauta clara do Grupo de Puebla reduzir o uso de companhias em paraísos fiscais.

O PT tenta, há anos, instituir o chamado imposto sobre fortunas. Da mesma forma, o partido defende a tributação progressiva pelo imposto de renda e o aumento da tributação sobre heranças.

Esses temas estão interligados, uma vez que o planejamento mais eficaz contra a tributação de fortunas e de heranças e á constituição de estruturas no exterior, tais como as offshore ou os trusts.

As mudanças legislativas sobre essa questão são de interesse imediato para os profissionais de tributação internacional.

A tributação de dividendos provavelmente fará parte da mesma reforma tributária que tratar dos temas acima.

 

2)      OCDE

 

O Grupo de Puebla defende a regulação do movimento de capitais, inclusive do investimento estrangeiro.

A OCDE, por outro lado, tem a desregulamentação dos fluxos internacionais de capitais como um dos principais objetivos.

O processo de adesão à OCDE provavelmente será mais lento tortuoso, devido a essas e outras incompatibilidades de programa.

O impacto é principalmente regulatório. O Brasil se preparava para mais de uma centena de mudanças legislativas e sublegais a fim de “caber” na OCDE. Será preciso observar se elas continuarão ou se serão suspensas.

 

3)       ESG E AGENDA AMBIENTAL

 

Provavelmente, o governo Lula irá privilegiar os aspectos políticos da ESG, tais como inclusão feminina e racial. Essas pautas não eram prioridade do governo atual.

O PT também tem afinidade com os ideais ambientalistas relacionados ao ESG, tais como contidos na Agenda 2030, da ONU.

Sobretudo na questão ambiental, está claro que há certo antagonismo entre o agronegócio e o PT.

De fato, há duas correntes que se entrelaçam e se influenciam mutuamente.

 

a)      O PT mantém boas relações com partidos de esquerda da Europa e EUA e tem boa circulação em organismos internacionais. Isso deve reduzir a pressão internacional sobre o agro brasileiro, reduzindo o risco de boicotes e, em tese, facilitando as exportações. Isso se dará politicamente, independentemente de grandes avanços nos índices de desmatamento;

b)      O novo governo deve impor controles mais rigorosos à produção, incluindo aplicação de multas ambientais e restrição ao uso de pesticidas. Espera-se também que haja movimentos de reforma agrária (inclusive por meios violentos) e restrição à expansão da fronteira agrícola.

 

O resultado dessa interação é bastante imprevisível, podendo ir desde o aumento líquido das exportações até a redução da produção agrícola total.

 

 

4)      RELAÇÕES COM AMÉRICA LATINA E BRICS

 

As relações do governo Bolsonaro com os BRICS não foram ruins. Houve cooperação da área de vacinas (China e Índia) e na recente crise dos fertilizantes.

Apesar disso, espera-se um recrudescimento da relação Brasil-China e Brasil-Rússia, devido ao alinhamento ideológico dos partidos dirigentes.

Na relação Brasil China, isso pode gerar oportunidades de negócio nas exportações de alimentos, que são muito afetadas pelas restrições fitossanitárias chinesas. Essas restrições podem ser flexibilizadas quando há vontade política.

 

A relação Brasil Rússia deve se manter em bom estado e até melhorar .

 

As relações com a América Latina, sob o aspecto político, prometem ser muito harmoniosas.

Quase todos os países da região compartilham a mesma linha ideológica. Essa comunhão se reflete nas resoluções do PT e do Grupo de Puebla visando à concessão de apoio financeiro a países da AL.

As resoluções falam em “uma rede de bancos regionais que atenderia os financiamentos setoriais e o ressurgimento da ideia do Banco do Sul. Uma expansão do atual Fundo de Reserva da América Latina (FLAR)”.

Em termos práticos, para o advogado as relações políticas tendem a desaguar em acordos relativos a vistos, migração de trabalhadores, reconhecimento de diplomas e outros mecanismos de cooperação.

 

5)      DROGAS E NARCOECONOMIA

Caso o governo tenha força política para tanto, é esperado que ele liberalize alguns entorpecentes, seja para uso médico, seja para uso recreativo.

Isso inseriria o Brasil na narcoeconomia, tal qual o Uruguai e alguns estados dos EUA.

 

6)      REDES SOCIAIS

 

O novo governo deve tentar regular as redes sociais.

Isso terá bastante impacto na economia criativa e no grande setor de anúncios online.

 

 

7)      ATUAÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA E REFLEXO NOS INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS

 

Espera-se um freio nos processos de desestatização e privatização que vinham ocorrendo.

Consequentemente, investimentos privados em transporte ferroviário, na cabotagem e na malha rodoviária devem se reduzir. Esses investimentos podem ou não ser retomados pelo governo, num projeto similar ao antigo “PAC”.

Simultaneamente, o aumento dos gastos públicos em projetos sociais é muito provável.

O resultado desse conjunto deve ser o aumento de gastos públicos e, consequentemente, da inflação e dos juros.

Esse cenário tende a favorecer e a concentração da atividade econômica em um número menor de empresas.

 

7.1) Mercado bancário

O processo de desconcentração bancária, iniciado pelo Banco Central há alguns anos, era uma prioridade do governo atual. Nada indica que essa desconcentração irá se manter como prioridade.

Ao contrário, espera-se que haja ampliação do crédito via bancos públicos.

A concentração de mercado bancário (ou, pelo menos, uma desaceleração do surgimento de novos concorrentes) aliada ao aumento dos juros favorece a manutenção do oligopólio bancário que temos hoje.

 

7.2) Investimentos estrangeiros

 

Mantidas essas premissas, o Brasil deve atrair capital especulativo, que apostará nos juros. Esse capital entrará por meio da bolsa de valores.

O investimento estrangeiro direto, aquele destinado a atividades produtivas, não tem uma tendência clara. Possivelmente o Brasil atrairá investidores grandes, que topem participar de projetos coordenados pelo governo, tais como grandes usinas, estradas, etc.

Cenário similar, talvez, à onda de investimentos chineses que houve durante os governos antigos do PT.

Não é possível prever, ainda, o comportamento do investimento estrangeiro privado.